“A roupa que a mulher usa, não está relacionada aos casos de estupro ocorridos no município. Quem estupra, não costuma atribuir a roupa da vítima ao fato, tanto que, na maioria dos casos recentes, elas não usavam roupas curtas quando foram violentadas, estavam de calça jeans ou usavam roupas normais”, avalia a delegada Letícia Mobis Alves, que há quatro anos responde pela Delegacia de Atendimento à Mulher de Três Lagoas (DAM).
A opinião da delegada se refere a um estudo feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que ouviu 3.810 pessoas entre maio e junho do ano passado, em 212 cidades, para saber a quantas anda a tolerância social quanto à violência contra as mulheres.
A pesquisa divulgada no dia 27 de março tomou grande proporção nacionalmentee acabou levando famosos e anônimos às redes sociais para manifestar sua repulsa à opinião da maioria dos brasileiros.
O estudo demonstra que 65,1% concordam inteiramente (42,7%) ou parcialmente (22,4%) com a frase "Mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas", enquanto 24% discordam totalmente, 8,4% discordam parcialmente e 2,5% se declaram neutros.Do total de entrevistados, 66,5% são mulheres.
“A pesquisa reflete a opinião machista do brasileiro, que acha que mulher é um mero objeto, como se a culpa da violência fosse dela, ou seja, que ela está pedindo para ser estuprada. A pesquisa é resultado da ideia de que o homem é como animal e que não pode controlar suas vontades e que a mulher não tem liberdade para se vestir como ela quer, de ficar à vontade, como se a roupa fosse um convite, e não é”, avalia a delegada.
“O mesmo fato percebemos na violência doméstica, onde sempre perguntam o que a mulher fez para merecer, como se ela fosse a causadora dos problemas e este é um pensamento que vem desde o tempo da Eva. Mesmo a gente estando sempre em estado de evolução, isso parece que não muda”, completa Letícia.
Um exemplo usado pela delegada é o de uma mulher grávida, em que o criminoso, uma pessoa do convívio dela, falou que a mulher se insinuava.
Conforme a delegada, em 2013 foram registrados seis casos de estupro contra mulheres adultas, enquanto 49 foram contra vítima vulneráveis, aquelas menores de 14 anos.
Já neste ano, foram feitos 12 registros de estupro de vulneráveis e três de mulheres adultas. “Este é um número atípico, considerado alto para os três primeiros meses do ano”, comenta ela.
Letícia faz questão de lembra que, até uma garota de programa pode recusar um cliente, caso queira. Mas se ela for forçada, o homem pode responder por estupro.
Outra informação repassada pela delegada, é que há casos de estupro de vulneráveis, em que o agressor chega a falar,em seu depoimento, que sua vítima, de apenas 8 anos, o provocou.
“Essa é uma ideia absurda, como se uma criança tivesse noção de sexualidade. Sempre destacamos que cabe ao adulto evitar o contato. Da mesma maneira que, por mais que uma mulher esteja numa situação de exposição de corpo e de sensualidade, ela não está convidando ninguém a agredi-la. A decisão da violência é sempre do agressor”, enfatiza.
PENA
A pena para casos de violência sexual pode chegar até a 15 anos, dependendo da situação da vítima, ou seja, se ela tem problemas mentais, se é idosa, dentre outros fatores.
A responsável pela DAM lembra que, quando se fala de comprovação deste tipo de crime, alei não exige que haja vestígio de conjunção carnal para que configure estupro. No caso de vulneráveis, meramente passar a mão, beijar, e atos libidinosos diversos, já configura crime, de acordo com ela.
DENÚNCIA
Mulheres adultas que se sentirem em alguma situação de violência, podem procurar a Delegacia da Mulher. A delegada Letícia orienta para que não tenham vergonha de procurar a DAM e denunciar.
Por fim, a delegada orienta as mulheres para que se protejam de propensos estupradores. “Se a mulher perceber que está sendo seguida e pode se tratar de um estuprador, deve correr para um local onde haja outras pessoas, como um bar ou posto de combustível, por exemplo, ou então, caso esteja passando um carro, que peça ajuda ao motorista. Jamais devem fugir para ruas escuras e desertas. Nem adianta buscar ajuda em residências, dificilmente alguém vai abrir a porta ao ouvir alguém pedindo socorro, por não saber do que se trata”, orienta.